O noticiário que faz mal

Distanciar-se do noticiário a fim de manter certa sanidade mental pode ser a escolha de algumas pessoas. Eu, por vezes, faço isso. Mesmo sendo jornalista, sendo professor de jornalismo, admito que, em vários momentos, procuro não acompanhar tudo que é noticiado. E isso não tem nada a ver com a qualidade do conteúdo informativo; tem a ver com minha busca pessoal por não me irritar com determinadas notícias, evitar perder a esperança no país e, principalmente, minha fé nas pessoas.

Esse tipo de atitude não representa alienação. Também não significa ignorar os acontecimentos. Muito menos se trata de um desconhecimento do que está acontecendo. Trata-se apenas de uma escolha para não alimentar sentimentos negativos que podem fazer mal.

Quando a gente acompanha o noticiário, é possível ver repetidas vezes o mesmo assunto. E abordado de diferentes maneiras, com inúmeros comentários e repercussões do fato.

É como um pênalti não marcado pelo juiz num jogo de futebol. Você viu o que aconteceu… Ouviu a versão do juiz e dos jogadores. Mas o jogo já acabou.

O que você pode fazer? Ver e rever o lance por horas, ouvir diferentes comentaristas especularem sobre o que ocorreu e até começar a semana discutindo o assunto com os amigos – inclusive no grupo do whatsapp. Ou pode simplesmente ir fazer outra coisa, ignorar os programas esportivos, silenciar os comentários que são publicados nas redes sociais. Enfim, seguir a vida.

De certa maneira, todo fato impactante produz efeito semelhante: ele é repercutido por horas, dias… Narrado de inúmeras maneiras. E, dependendo do acontecimento, pode fazer com que a gente fique pensando naquilo, se aborrecendo, se entristecendo e até brigando com pessoas em função de algo que a pessoa disse, ou de como reagiu.

Com frequência, as pessoas são passionais. Tomam partido. As redes sociais, em função da lógica dos algoritmos, potencializou a repetição de temas e versões que se assemelham; por outro lado, promoveu o silenciamento da diversidade. Isso faz com que o consumo de informação, ao invés de esclarecer, cegue as pessoas.

Por isso, certo distanciamento é produtivo: mantém a sanidade mental e a isenção para um julgamento mais equilibrado do que ocorre no cotidiano. Torna-se possível pautar nossa vida sem a lente do exagero, da repetição enganosa e das inúmeras versões que, na prática, são apenas isso: versões.

Jornalismo descartável

A quantidade de informações disponível ao público atualmente gera uma angústia constante: o que é, de fato, relevante? E problema vai para além disso. O que se publica, divulga etc. quase sempre é descartável.

É comum abrir as páginas dos jornais, folheá-las e ter a impressão que nada ali é interessante. Vale o mesmo para os telejornais, emissoras de rádio e sites na internet. A gente espia, ouve, assiste e “vai do nada para lugar nenhum”. Nada ali parece ser realmente significativo. Eu experimento essa angústia diária e, com frequência, chego à conclusão que boa parte dos noticiários são descartáveis. Não fazem diferença alguma se deixarem de existir.

Nos noticiários locais e regionais, a situação é ainda mais visível. Com exceção do noticiário policial (que não aprecio, mas chama a atenção de parte expressiva da população) e, vez ou outra, alguma polêmica política, o que existe de informação que vale a pena ser consumida? Quase nada!

Resultado da saturação? Em parte, sim. A pseudo necessidade de gerar muito conteúdo atualizado resulta numa espécie de esgotamento do público. Afinal, o que é novidade? O que é diferente? Mas existe um outro problema. Os veículos de comunicação têm levado pouco em consideração o desejo das pessoas. Oferta-se conteúdo, mas não se planeja o que será disponibilizado. A notícia então torna apenas mais um produto na prateleira, sem utilidade alguma.

Daniele e o namorado dormindo: o que eu tenho com isso?

Nada. Nem você. Mas por que a foto saiu em quase todos os sites de notícias? Porque um montão de gente gosta desse tipo de “notícia”.

Pra quem não viu e não sabe do que estou falando (não está perdendo nada, é preciso deixar claro), trata-se desta “notícia” aqui:

Danielle Winits posta foto na cama com o namorado na Tailândia

A atriz, que sabe como poucos manter-se em evidência na mídia, postou a foto. E, claro, a foto, com direito a algumas frases e parágrafos, foi parar nos principais sites e blogs.

Sempre tem aqueles que criticam a mídia por esse tipo de publicação. Eu diria que a mídia até tem responsabilidade, mas, nesses casos, a responsabilidade maior é do público – que consome baboseiras. O que tem de informação na foto? O que tem de interessante? Na verdade, o que há de interessante nesse namorado e nessa atriz? Desculpa aí, eu não achei nada. Mas se a mídia noticia é porque tem gente lendo esse tipo de bobagem.

Folha vai cobrar por notícias na rede: o conteúdo free estaria com os dias contados?

Sou fã do compartilhamento de conteúdos de graça. O mundo da rede é o mundo free. Livre. Livre para produzir e para consumir.

Reconheço que jornalões estão perdendo leitores e precisam encontrar formas de aumentar as receitas. Entretanto, não entendo que cobrar do público, como fará a Folha a partir dessa quinta-feira, 21, é a saída para melhorar o caixa.

Não vou apostar que a proposta não dará certo – afinal, os caras devem ter consultoria, pesquisa e tudo mais para decidirem por tal medida. Apenas digo o que vou fazer: vou ler as 10 notícias/mês de graça. As outras 10, com cadastro. E pronto. Vou fuçar noutros sites, nas redes sociais, mas não pagarei os R$ 29,90 para seguir lendo os textos da Folha. E sei que não deixarei de estar informado por abandonar a Folha.

O site terá mais colunistas, blogueiros, conteúdo ainda mais diversificado? Sim. Pelo menos é o que a Folha promete. Entretanto, para mim, o conceito de rede ainda é free, e com oferta de publicidade – como faz desde o princípio o Google e, mais recentemente, o Facebook.

Defendo que gente que produz seja remunerado. E não importa se é rádio, televisão, impresso ou internet. Porém, ainda não dou conta de pagar para ter acesso a conteúdo disponível na web. Acho que o caminho dos portais de notícias não deveria ser esse. Como tudo na internet ainda é um tanto experimental, vamos ver se a “novidade” da Folha cairá nas graças do leitor. Mas sem pagar pra ver.

O que vale ser publicado?

É interessante como uma semana de férias muda nosso ritmo. Tem coisas que a gente faz no “piloto automático”. Quando desliga e fica um tempo sem aquela rotina, a impressão que dá é que precisa readquirir o ritmo. Escrever faz parte da minha lista de coisas que preciso fazer continuamente para não perder o hábito.

Ontem, por exemplo, apareci por aqui, compartilhei uma música. No twitter, escrevi uma ou outra coisa, mas me senti meio “amarrado”. Os assuntos parecem desinteressantes. Ou pelo menos não merecedores de serem divididos com os seguidores da rede.

Por sinal, o que realmente vale a pena ser publicado?

Ontem, retornei ao microfone da CBN e também à sala de aula. Ao apresentar o programa de uma das disciplinas, disse aos alunos que vamos discutir sobre “saturação da informação”. Ou seja, a proposta é mostrar que se produz tanta notícia que não damos de consumir tudo. E isso acontece porque vivemos sob a ditadura do novo. Não importa a relevância; importa ser novo, diferente, atual. E coisas do tipo…

Grávida, Letícia Birkheuer exibe celulite em praia francesa

Rodrigão ganha beijo de Adriana

… viram notícia.

Eu confesso que tenho dificuldade em usar o blog como muita gente usa. Até compartilho algumas coisas pessoais, uma futilidade ou outra, mas não dou conta de escrever algo que não tenha uma aplicação, ou seja resultado de uma reflexão. No twitter ou facebook, não vejo graça usá-los para dizer onde estou, o que estou fazendo ou para expressar um sentimento momentâneo.

Não quero que dizer que este jeito de usar as redes é a correta. De jeito nenhum. Cada um faz o que bem entende. Porém, num mundo de tanta futilidade, não consigo perder tempo lendo coisas vazias.

Talvez eu ande chato demais…

A “morte” de Amin Khader: qual a responsabilidade da imprensa?

Uma das discussões que faço com meus alunos na disciplina de Leitura Crítica da Mídia é sobre o comportamento da imprensa em relação aos seus próprios erros. Um autor que uso como referência para tratar do assunto, Patrick Charaudeau, diz que a mídia não é autocrítica. Ela transfere os erros para os outros, para as circunstâncias; nunca se auto-avalia, nem tenta analisar qual sua responsabilidade no processo.

Estava pensando nisso ao ver na manhã desta quarta-feira o desdobramento envolvendo a falsa notícia de que o promoter Amin Khader teria morrido. O foco está em quem inventou a história. Nenhum veículo de comunicação assumiu ou vai assumir que esqueceu de algo básico: ligar para o telefone do “morto”, para algum empregado ou para alguém que morasse com Amin. E mais: se ele estava morto, o corpo deveria estar em algum lugar. Então por que não checar esse detalhe tão básico a fim de confirmar a morte?

Ninguém fez isso. O fato de um amigo(?) ter noticiado a morte foi suficiente para compartilhar com o público. Era preciso ser rápido. O mais rápido possível devido a relevância(?) e urgência(?) do assunto.

Se foi o David Brazil ou o próprio Amin que inventou a história, pouco importa. Quer dizer, importa. A gente pode discutir o caráter das pessoas, a necessidade de aparecer, a falta de bom senso… coisas do tipo. Mas importa ainda mais refletir sobre o jeito de se produzir e dar notícias.

Não tem graça alguma informar e desmentir depois. Perde-se tempo demais com bobagens. É a espetacularização da ausência, do vazio, do não existente. E o público embarca. O que é relevante fica silenciado, ou em segundo plano, pois a novela de uma falsa morte torna-se mais importante que qualquer outro fato.

Convenhamos, está na hora de virar a página. E a mídia (na pessoa inclusive de jornalistas, apresentadores e outros profissionais) de reconhecer que também é responsável por situações como essa. Quem deu eco a mentira foram os veículos de comunicação e os apressados de plantão que, inocentes ou tolos, preferiram a farsa a gastar tempo em busca da verdade.

É jornalismo ou preconceito?

Uma gorjeta. Tudo bem… Era um bela gorjeta: 75 reais. Mas a gorjeta de 75 reais virou notícia na página online do jornal O Globo. O dono da boa ação é o deputado federal Everardo Oliveira da Silva.

Conhece? Talvez não por este nome. O deputado Everardo é o humorista Tiririca. Acho que agora ficou fácil…

Desde que foi eleito, Tiririca se tornou alvo da mídia. Uma gorjeta para o barbeiro vira notícia. Qualquer movimento, rende nota da imprensa.

Normal? Não sei.

O fato de ter sido o mais votado justifica os holofotes? Ou a motivação implícita seria um certo preconceito com o humorista?

Tá… Vamos combinar… Também acho um absurdo a eleição do Tiririca. Não acredito que tenha perfil pra ser deputado. Mas, convenhamos, ele tinha o direito de disputar vaga na Câmara. Como todo mundo tem. Se há culpados, estes são os eleitores e o sistema eleitoral brasileiro que leva lideranças políticas a usarem gente como ele para garantir mais vagas para o partido no Legislativo.

Feito o esclarecimento, voltemos ao tema central: a cobertura dada aos movimentos do deputado Tirica se justifica? Não tem nada, nadinha de preconceito?

Quantos outros parlamentares ocupam vagas na Câmara Federal – e até no Senado – e também fazem papel ridículo? Se é para ridicularizar o Tiririca, outros também não renderiam pauta? Ou o fato de não serem famosos seria o motivo? Afinal, embora pagos pelo nosso dinheiro, esses ilustres parlamentares desconhecidos não dão audiência, né?

Bem, o papo aqui não tem a pretensão de trazer nenhuma conclusão. É só pra pensar alto. É só uma reflexão sobre hábitos da imprensa, e nosso olhar para as notícias – que acaba motivando as escolhas da mídia.

Jornalismo de prestação de serviço

O jornalismo de prestação de serviço está cada vez mais presente no noticiário nacional. Certos assuntos já não são exclusividade de programas matinais – tipo Ana Maria Braga, Hoje em Dia etc. Também ocupam espaço em jornais tradicionais das grandes emissoras.

Na edição desta quarta-feira de um deles está em destaque:

Saiba como escolher o sutiã ideal

É informação? Sim. É útil? Sim. É jornalismo? Sim. Mas jornalismo com todas as características trazidas pela pós-modernidade. Ou seja, o foco está nas necessidades do indivíduo; não na transformação social.

É fato que muita gente busca esse tipo de conteúdo. Há consumo. E não são informações descartáveis. Auxiliam as pessoas em suas escolhas, nos melhores serviços etc. Eu mesmo busco com frequência informações sobre produtos que pretendo comprar – um smartphone, um televisor etc. Porém, o que me preocupa é que, embora esse tipo de conteúdo seja necessário, tem faltado nos veículos de comunicação a informação relevante, com profundidade, que ajuda a esclarecer sobre os acontecimentos. 

As revistas da semana

VEJA: – Enfim, alguém me entende. O primeiro manual da Sociedade Brasileira de Pediatria liberta os pais da rigidez das regras do passado e mostra como pode ser mais tranquilo cuidar de bebês e crianças pequenas. Nunca foi tão simples cuidar das crianças pequenas. O chefe do mensalão já opera 2010. Cassado, José Dirceu deixa em segundo plano seus negócios meio privados, meio estatais para mergulhar de cabeça na campanha presidencial de Dilma Rousseff. O Brasil na rota do Kindle. Leitor eletrônico da Amazon começa a ser vendido no Brasil a partir da próxima semana. O lançamento global do produto é o maior salto do livro digital.

ÉPOCA: – O último livro que você vai comprar. Chega ao Brasil o Kindle, o leitor eletrônico que guarda 1.500 volumes e promete revolucionar o jeito como lemos. Exclusivo na Época: acusado conta como o Enem foi roubado. Cinema: um executivo brinca de espião. Em “O desinformante”, Matt Damon é um bioquímico que passa informações pouco confiáveis sobre crimes ao FBI. O Nobel de Obama. Um prêmio às boas intenções. Com apenas 263 dias de mandato, Barack Obama é agraciado mais por seu esforço pela paz do que por resultados concretos.

ISTO É: Lula na telona. Cinema eleitoral (nada) gratuito. Com recursos de R$ 16 milhões e carregado de apelo emocional, o filme da história do presidente Luiz Inácio Lula da Silva se transforma em poderosa arma para a eleição de 2010. A crise do Enem desperta um novo movimento estudantil. Além do prejuízo financeiro, põe em xeque o sonho de acabar com o vestibular. Na Isto É, uma entrevista com Muricy Ramalho “O futebol é um grande negócio”. O técnico mais bem-sucedido do futebol brasileiro na atualidade fala de homossexualismo, drogas, política e aposentadoria.

CARTA CAPITAL: Um Deus cabo eleitoral. A ofensiva de evangélicos e católicos sobre os meios de comunicação à vista de 2010. Ainda na edição, a estreia do suplemento trimestral CartaVerde e a derrota de Silvio Berlusconi na Justiça italiana. Rio 2016. Depois do oba-oba. O risco de corrupção nem é o mais preocupante. O desafio é vencer a crônica incapacidade do Brasil de planejar e cumprir metas de longo prazo.